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Mona Lisa Overdrive (Trilogia do Sprawl #3)

Mona Lisa Overdrive, de William Gibson, é o terceiro e último volume da Trilogia do Sprawl, uma das mais cultuadas da ficção científica. A obra dá sequência aos acontecimentos de Neuromancer e Count Zero e mantém o mesmo estilo cyberpunk. Porém, agora a utilização do ciberespaço evoluiu de tal modo que as inteligências artificiais atingiram a autoconsciência. Libertas do controle humano, elas povoam a Matrix e assombram os usuários.
Em uma história com altas doses de ação e aventura , o romance leva ao leitor novos personagens, como: Mona, uma jovem prostituta a quem é oferecida uma grande oportunidade, Angie, uma popstar do stim, que possui a habilidade de conectar-se ao ciberespaço sem auxílio de nenhum dispositivo e Kumiko, uma jovem que teve de vir do Japão para se safar de uma guerra entre gangues e encontra apoio em uma experiente samurai das ruas. Essa história conclui os eventos iniciados em Neuromancer, fechando assim a trilogia ícone do cyberpunk
Título: Mona Lisa Overdrive
Autor: William Gibson
Série: Trilogia do Sprawl #3
Editora: Aleph
Tradutor: Carlos Irineu
Ano de Publicação: 2017 / Páginas: 320


Mona Lisa Overdrive encerra a Trilogia do Sprawl de William Gibson iniciada com o revolucionário Neuromancer e expandida em Count Zero. Publicado originalmente em 1988, a conclusão da cultuada saga precursora do subgênero de cyberpunk, recebeu diversas nomeações entre os principais prêmio literários de ficção científica.
A realidade de Mona Lisa Overdrive se mostra ainda mais decadente, com enormes parques industriais abandonados, máfia e zaibatsus transnacionais monopolizando o poder político e econômico, a poluição e a contaminação por agentes radioativos e biológicos convivendo lado-a-lado com toda a sorte de miséria urbana. O simstim, a matrix e as drogas sintéticas cada vez mais elaboradas (algumas assinadas por designers) são as válvulas de escape mais requisitadas pela população marginalizada. As Inteligências Artificiais, agora plenamente autoconscientes e independentes, povoam todo o ciberespaço assombrando e interagindo com os usuários da matrix, a grande alucinação coletiva por meio do qual um cowboy/hacker pode visualizar e interagir em tempo real com os mais diversos fluxos e bancos de dados informáticos.
O enredo de Mona Lisa Overdrive se passa cerca de oito anos depois de Count Zero e, assim como acontece no livro anterior, se desenvolve de forma intercalada em capítulos curtos até que os vários plots, a priori, independentes se mesclam num único clímax simultâneo. Num dos plots acompanhamos Kumiko, uma garotinha asiática, filha dum chefão da Yakuza que por questões de segurança, acaba de ser enviada para Londres onde deve ficar até que uma guerra entre as gangues dos líderes da máfia japonesa se resolva. Na cidade londrina ela fica praticamente em cativeiro aos cuidados de capangas dum chefe da máfia local, entre eles, Sally Shears uma mulher misteriosa por quem ela sente uma certa afeição que logo se transforma em amizade.
A segunda história acompanha Slick Henry, uma espécie de artista solitário que passa o dia criando esculturas robóticas e que vive numa vastidão deserta e envenenada por produtos tóxicos onde antes existiam fábricas e um parque industrial. Como consequência de repetidas punições com uma técnica de lavagem cerebral pelos furtos que cometeu, Slick sofre de constantes episódios de perda de memória, não conseguindo se lembrar do que fez enquanto sua mente esteve inconsciente. Como pagamento por ter tido a vida salva por um criminoso, ele é designado para cuidar de um homem em estado comatoso, ligado a um dispositivo cibernético.
Angie Mitchell, protagonista de Count Zero, é hoje uma superestrela do simstim. Sua capacidade de interfacear com a matrix diretamente, sem decks, devido aos implantes que possui na cabeça está prejudicada devido ao uso frequente de drogas sintéticas sofisticadas fornecidas por sua própria empresa de produção, a Sense/Net. Angie se encontra sozinha, num luxuoso hotel à beira mar sofrendo terríveis crises de abstinência. Bobby Newmark, o Count Zero, que fora seu namorado está desaparecido. E finalmente, Mona, a personagem que dá nome ao livro é uma jovem prostituta vivendo em meio à miséria duma cidade pequena. Ela vive com uma espécie de cafetão, se prostitui quase que exclusivamente para manter o vício em wix e acaba sendo contratada por uma fortuna por um agente misterioso interessado em sua notável semelhança física com Angie… Molly Millions, Case, o Finlandês e Lady 3Jane de Neuromancer também retornam, ora ativamente e ora apenas como citações.
Assim como em Count Zero, a profusão de personagens coadjuvantes pouco relevantes em torno dos protagonistas e a demora para as tramas paralelas se entrelaçarem acabou por tornar a leitura um pouco confusa em alguns momentos. Mas em Mona Lisa o ritmo frenético de ação em torno de linhas narrativas mais explícitas me manteve grudado à trama e ansioso pelas próximas páginas. O uso de alguns personagens já conhecidos, além duma melhor identificação, possibilitou também que o autor focasse mais no desenvolvimento do que na apresentação de novos e inéditos contextos para cada um deles. A não ser com Molly, mas compreendo que era preciso atualizar a protagonista mais cativante da trilogia nestes quinze anos decorridos entre a primeira aparição dela e o presente.
Ao contrário do que vinha acontecendo nos livros anteriores, em Mona Lisa Overdrive os personagens humanos superam as Inteligências Artificiais em vários momentos, embora Colin, uma espécie de assistente pessoal de Kumiko, apesar de irritante, tenha sido uma adição curiosa e divertida ao time de Wintermute, de Continuidade e dos loas haitianos. Mas talvez seja na intersecção entre humanos e máquinas, carne e bits, hardware e software, que resida o maior trunfo da trilogia de Gibson. À semelhança de Virek, Angie e Bobby transcendem a condição humana e numa espécie de simbiose tornam-se parte indissociável da própria matrix, ela através dos implantes de biochip feitos pelo pai na infância e ele através do Aleph, um dispositivo com tamanha capacidade de armazenamento e processamento que é capaz de carregar uma simulação completa de toda uma realidade.
Em Mona é perceptível a evolução da escrita que Gibson parecia experimentar ainda sem pleno domínio em Count ao passo que ele retoma boa parte daquilo que mais me agradou em Neuromancer a citar a prosa sinestésica e os seus personagens complexos e problemáticos, mais ainda assim compreensíveis e adoráveis. O desfecho foi um pouco anticlimático quando comparado aos livros anteriores, mas ainda surpreende dadas as suas implicações. Para quem chegou até aqui, os jargões tecnológicos e conceituais no livro já são facilmente assimilados conforme vão sendo citados e com uma fluidez impressionante. As interações com as IAs, as descrições das cenas de simstins e as alucinações e reações desencadeadas pelas drogas sintéticas se tornaram maravilhosos lugares comuns, onde nos sentimos em casa e sem nenhum estranhamento enquanto o enredo se desenvolve. A edição brasileira mais recente é da editora Aleph e conta com tradução de Carlos Irineu, que assim como os volumes anteriores foi revisada e readequada para o lançamento em um novo box com projeto gráfico assinado pela Desenho Editorial e com artes de capa de Josan Gonzalez, mas o livro também se encontra disponível de forma avulsa.
Acredito que apenas quem tenha gostado muito dos livros anteriores ou tenha ficado curioso por mais do mundo cyberpunk de Gibson vá se aventurar até o volume final da trilogia e ainda que ele apresente alguns problemas, ouso dizer que Mona Lisa Overdrive coroa com êxito a saga, tanto por se aprofundar nas consequências dos livros anteriores quanto por manter todas as muitas possibilidades daquele mundo em aberto. A matrix é agora algo vivo e em constante evolução, e fomos nós, como espécie, brincando de deuses e cowboys em meio a nossa própria ruína quem tornamos isto possível, naquele maravilhoso instante “quando isso mudou”.

25 de Março! Dia de Ler Tolkien - #TolkienReadingDay 2018

Dia 25 de Março é um dia histórico na ficção de J. R. R. Tolkien. Trata-se do dia da queda do temível Sauron e de sua fortaleza Barad-dûr em Mordor, dando assim um fim à Guerra do Anel e à Terceira Era da Terra-média tal como é narrado na trilogia O Senhor dos Anéis.
Entre os fãs e admiradores da obra de Tolkien convencionou-se que este é um dia propício para relembrar e celebrar toda a sua vasta criação. Todos os anos, desde 2003, a Tolkien Society vem organizando e promovendo o Tolkien Reading Day (Dia de Ler Tolkien) em todo o mundo através de seus vários fã-clubes e afiliados. Ela incentiva que os fãs leiam ou releiam algumas de suas passagens favoritas dos livros de Tolkien neste dia, além de encorajar museus, livrarias e escolas a realizarem os seus próprios eventos de leitura e discussão das obras do Professor. O Dia de Ler Tolkien se assemelha ao Bloomsday, dia destinado a celebração do romance Ulysses de James Joyce e que acabou se tornando um feriado nacional na Irlanda, terra natal do escritor.
Todo ano também é sugerido um tema pela Tolkien Society para ser observado e discutido mais a fundo e o de 2018 é “As Muitas Formas de Ser um Hobbit”. De todas as coisas criadas por Tolkien talvez a mais marcante seja a sua raça de pequeninos, os hobbits, um povo diminuto, humilde e sociável, que vive em tocas confortáveis e que gosta de boa comida, boa música, de tabaco e fogos de artifício. Além, é claro, das festas de aniversário, de genealogia e jardinagem e demais coisas simples do cotidiano, ou seja, de aproveitar ao máximo e com calma o melhor da vida. É de se surpreender que seres tão pouco desinteressados de feitos heróicos, poderes mágicos e guerras fantásticas desempenhem um papel tão fundamental em eventos que colocam a liberdade de todas as outras raças e povos da Terra-média em risco e mais ainda de sabermos que com uma fibra e determinação incomuns e que não aparentam, eles vão em frente e cumprem com a missão que lhes é dada suportando um fardo terrível durante uma das jornadas mais desafiadoras já testemunhadas naquele mundo.
Impossível não se encantar por eles, mas quais, dentre as muitas formas de ser um hobbit, você mais aprecia? Um morador típico do Condado que preza e valoriza cada um dos pequenos prazeres de um cotidiano pacato? Alguém que coloca a amizade acima da própria vida como Sam? Alguém que enfrenta o destino que lhe é imposto assumindo um fardo muito maior do que si como Frodo? Alguém festeiro, brincalhão e travesso tal como a inseparável dupla Merry e Pippin? Ou alguém que não queira de jeito algum abandonar a toca para viver uma grande aventura, mas que acaba se saindo como um dos mais habilidosos aventureiros de todos os tempos como Bilbo? Exemplos não faltam e todos eles são coloridos, divertidos e cativantes! Não admira que as pequenas criaturas de Tolkien sejam tão populares e deem tanta vida a seu mundo fantástico!
Dado o tema, O Hobbit, A Sociedade do Anel e A Sabedoria do Condado são as melhores indicações de leitura para a data! Abra-os e deixe a imaginação voar! É altamente recomendável acompanhar também as atividades das Tocas do Conselho Branco, do Tolkien Brasil, do TolkienTalk e do Valinor, as maiores referências em Tolkien no Brasil. Em São Paulo a Harper Collins Brasil, a nova casa editorial do autor no país, promoverá na data um bate-papo com os editores e tradutores e uma palestra com o tema “O valor literário da obra de J.R.R. Tolkien” na Reserva Cultural (Avenida Paulista, 900). A Toca do Rio de Janeiro já anunciou uma roda de leitura coletiva em Copacabana (Rua Pompeu Loreiro, próximo ao metrô Cantagalo).
Mas há ainda muitas coisas tão legais quanto e que você pode fazer neste dia para aproveitar e celebrar a data. Sempre recomendo a lista de sugestões do Mapingua Nerd. O Dia de Ler Tolkien também é importante para lembrar fatos marcantes relativos a biografia do autor e sua obra. Em 2018 comemoramos o 126º ano de nascimento do autor, e o 101º ano de início da própria Terra-média com os primeiros manuscritos do The Book of Lost Tales, o 81º da primeira publicação de O Hobbit e do início da escrita de O Senhor dos Anéis e os 41º ano da primeira publicação de O Silmarillion.
A data também pode servir de estímulo para uma releitura completa ou marcar o início de uma nova leitura de uma obra de Tolkien que ainda lhe seja inédita. Há diversos livros de Tolkien disponíveis no Brasil e as opções de leitura são as mais variadas possíveis, desde o trio básico: O Hobbit, O Senhor dos Anéis (A Sociedade do Anel, As Duas Torres, O Retorno do Rei) e O Silmarillion, até os que se aprofundam na cultura e mitologia da Terra-Média: Os Filhos de Húrin, Contos Inacabados, A Última Canção de Bilbo, As Aventuras de Tom Bombadil, os livros infanto-juvenis e de contos: Mestre Gil de Ham, Mr. Bliss, Árvore e Folha, Ferreiro de Bosque Grande, Roverandom, As Cartas do Papai Noel, além dos trabalhos acadêmicos do professor e dos que envolvem outras mitologias: A História de Kullervo, A Queda de Artur, Sigurd e Gudrún, Beowulf e das cartas, biografias, atlas e ensaios de críticos sobre as obras do Professor. Opções não faltam!
Compartilhe conosco e com o mundo o que você vai estar lendo ou fazendo neste dia, comente sobre os seus trechos favoritos, debata sobre os livros e as histórias com os amigos e ajude a espalhar esta tradição nas suas redes sociais com as hashtags #TolkienReadingDay e #DiaDeLerTolkien. Vou me permitir citar alguns dos meus trechos favoritos relacionados aos hobbits:
“É um negócio perigoso, Frodo, sair de sua porta. Você dá um passo para a estrada e se você não manter seus pés, não há como saber onde você pode parar.” – Bilbo Bolseiro
“Há mais coisas boas em você do que você sabe, filho do gentil Oeste. Alguma coragem e alguma sabedoria, misturadas na medida certa. Se mais de nós déssemos mais valor a comida, bebida e música do que a tesouros, o mundo seria mais alegre.” – Thorin Escudo de Carvalho
“As aventuras nunca acabam? Acho que não. Outra pessoa sempre tem de continuar a história.” – Bilbo Bolseiro
“Mesmo a menor das criaturas pode mudar o curso da história.” – Lady Galadriel
“Vitória, afinal das contas, acho eu. Bem, me parece uma coisa muito melancólica.” – Bilbo Bolseiro
“Mas no final é só uma coisa passageira, essa sombra. Mesmo a escuridão deve passar.” – Samwise Gamgee
“Nem tudo que é ouro brilha, nem todos os que vagueiam estão perdidos” – Bilbo Bolseiro
“É inútil retribuir vingança com mais vingança: não vai curar nada.” – Frodo Bolseiro

Orange

No primeiro dia de aula do 2º ano do ensino médio, a tímida Naho Takamiya recebe uma misteriosa carta endereçada a ela, datada de 10 anos no futuro. O seu conteúdo relatava com detalhes minuciosos e comentários pertinentes todos os acontecimentos do dia de Naho, e qual a surpresa, não só o que estava escrito realmente acontecia como também o remetente era ela mesma. O objetivo da carta era direcionar a “Naho do presente” a impedir o maior arrependimento da vida da “Naho do futuro”: o suicídio de Kakeru Naruse, o primeiro amor da garota. Como essas cartas chegam até Naho? Por quê Kakeru irá se matar? E o mais importante: será mesmo que saber o que vai acontecer ajuda a impedir o futuro de outra pessoa?
Título: Orange
Autora: Ichigo Takano
Tradutor: Naguisa Kushihara
Editora: JBC / Ano 2015
Acabamento: 13,5 x 20,5 cm, papel offset, tankobon, ~220 págs


Lembro que o anúncio de publicação de Orange no Brasil pela editora JBC em 2015 foi bastante comemorado pela comunidade de leitores de mangás e de ter ficado bem curioso com sua história. Originalmente publicado no Japão pela revista shoujo Bessatsu Margaret (Shueisha) a partir da edição de abril de 2012, a série em mangá de Ichigo Takano fez um enorme sucesso, mas acabou entrando em hiato a partir de dezembro do mesmo ano, devido a problemas de saúde da autora. Alguns anos depois, em 2014, Orange foi retomado, passando a ser publicado na Monthly Action, da editora Futabasha e sendo finalizado em 2015 com um total de 5 volumes encadernados. Como comumente ocorre com os mangás de grande sucesso, Orange também recebeu adaptações em anime e em live-action.
Na trama, Naho Takamiya, uma estudante do segundo ano do colegial recebe em seu primeiro dia de aula uma suposta carta enviada por uma versão de si mesma, só que dez anos no futuro. A carta narra acontecimentos dum futuro próximo e traz orientações de como a Naho do presente deve agir para evitar arrependimentos que a Naho do futuro gostaria que ela não vivenciasse. A carta fala em culpa e em remorso e diz que Naho deve se esforçar ao máximo para salvar Kakeru Naruse, um novo aluno recém chegado de Tóquio e aquele que também virá a se tornar o primeiro grande amor da garota. A princípio ela acha isso bastante estranho e até pensa que é um trote de mal gosto, mas conforme os relatos da carta se tornam fatos e acontecem realmente, Naho passa a confiar totalmente no que a sua “eu” do futuro diz. Ela decide mudar a si mesma e alterar o futuro para salvar Kakeru de um acidente iminente, evitando assim o arrependimento relatado pela Naho do futuro. O primeiro pedido da carta é que ela e os amigos não convidem o Kakeru para nada depois da aula, não importa o que aconteça, naquele dia ele deveria voltar pra casa sozinho. Convidá-lo seria o estopim para arrependimentos amargos, mas eles não tinham como saber da gravidade disto no momento e não puderam evitar ser simpáticos com o novo amigo.
Em torno das cartas e das orientações que elas dão para a Naho do presente, desenvolve-se a maior parte da trama ao longo dos cinco volumes originais. O cotidiano escolar repleto de atividades extra classe, a relação de amizade entre Naho e seu grupo composto por Suwa, Azu, Takako e Hagita, e o surgimento de um tímido romance com Kakeru, além da participação de todo o grupo de amigos de Naho na missão de salvá-lo dão ainda mais corpo à premissa básica. Alguns dilemas logo surgem, Naho começa a se perguntar até que ponto ela tem o direito de intervir e mudar o destino de uma pessoa, ou o quanto ela deixa o conteúdo da carta influenciar suas decisões. Paralelamente, e em outra linha temporal, acompanhamos o mesmo grupo de amigos, dez anos mais velhos e sem a presença de Kakeru entre eles. Além disso, neste futuro que eles querem evitar, também descobrimos que Naho está casada com Suwa, que foi quem a apoiou e ajudou a superar a morte do Kakeru e seguir em frente.
A arte de Takano Ichigo é simples, mas bastante expressiva e abusa bastante, mas com competência do recurso de super deformed (sd), trazendo leveza e comicidade ao enredo, que num tom geral é bastante fluido e divertido, e sem a incômoda e desnecessária presença de “fanservice”. Os sorrisos de seus personagens são tão sinceros que nos fazem rir junto durante a leitura. Destaque para as artes de capa, coloridas com pigmento e tinta guache, e para alguns dos cenários cujas referências visuais vieram de fotos de Matsumoto, a cidade da autora e também onde se passam os eventos de Orange. Exceto pela inversão de nome e sobrenome da autora na lombada do quinto volume,não notei quaisquer outros erros gráficos ou de revisão durante a leitura e as edições seguem o padrão habitual dos demais mangás da JBC, com capa em cartão e miolo em papel offset. Um spin off (e sexto volume) recontando a mesma história, mas agora do ponto de vista do Suwa, está para ser lançado em breve no Brasil, enquanto no Japão encontra-se em produção de um sétimo volume. Mas apenas os volumes originais já são suficientes para você apreciar de forma plena e satisfatória a história. O mangá ainda traz em suas páginas finais uma outra história como extra, Haruiro Astronaut: Astronauta Cor de Primavera que basicamente aborda com muito bom humor os romances escolares de uma dupla de irmãs gêmeas.
A aparente simplicidade e o bom humor da trama, de Orange esconde uma certa profundidade por explorar além das mágoas e dos arrependimentos dos personagens, temas bem mais densos e espinhosos tais como a depressão e o suicídio. Há um momento de intensa emoção em que pela perspectiva de Kakeru e em retrospecto vemos o quanto cada esforço dos amigos para se aproximarem dele fez diferença na vida do rapaz. Chega a ser um pouco paradoxal que o mangá aborde depressão e suicídio, mas a autora conduz a trama com uma dose equilibrada de leveza e bom humor em contraste com os dilemas pesados e uma forte carga emocional. Há uma explicação plausível envolvendo multiversos e diversas linhas temporais para explicar como as cartas podem chegar do futuro. Essa era uma dúvida que tive desde que li a sinopse e fiquei satisfeito com a forma como a autora justifica o uso do recurso da viagem no tempo aqui.
Com uma história que cativa pela simplicidade e pelas fortes emoções que desperta, Orange tanto diverte quanto emociona. Não é difícil se afeiçoar aos seus personagens, tampouco ao drama e a história que eles vivenciam. A vontade é de nos esforçarmos juntos para tornar cada dia da vida de Kakeru um pouco mais especial, aliviando-o do fardo pesado da culpa e do remorso que ele carrega sozinho. O mangá me fez pensar que em casos como o de Kakeru deixar para amanhã pode ser tarde demais. Foi com lágrimas nos olhos que fechei o último volume, pensando não apenas em tudo o que já deixei de fazer, mas também de como gestos e atitudes tão simples podem significar muito para quem precisa ou encontra-se fragilizado como o protagonista naquele momento. A maior lição de Orange é justamente a de que devemos nos esforçar ao máximo para estarmos e sermos presentes na vida daqueles por quem verdadeiramente nos importamos e de que não precisa ser nada fantástico ou impossível, um conselho, uma conversa, um convite ou uma gentileza já são o suficiente. Simples, tocante, gostoso de ler e tão doce e radiante quanto a fruta e a cor que lhe emprestam o nome, assim é Orange e recomendo!

Com Amor, Simon (Love, Simon)




Todo mundo merece uma grande história de amor. Mas para Simon Spier, de dezessete anos, é um pouco mais complicado: ele ainda não contou para a sua família ou amigos que é gay, e não faz ideia de qual seja a identidade do seu colega anônimo que divide o mesmo segredo. Resolver as duas questões se mostra divertido, aterrorizante e uma mudança de vida definitiva.



Título: Com Amor, Simon
Título Original: Love, Simon
Lançamento/Duração: 2018 - 1h 49min
Gênero: Comédia/Drama/Romance
Direção: Greg Berlanti
Roteiro: 
Elizabeth Berger e Isaac Aptaker
Elenco: Nick Robinson, Jennifer Garner, Josh Duhamel, Katherine Langford, Alexandra Shipp, Logan Miller, Keiynan Lendenborg Jr, Talitha Bateman, Miles Heizer


Existem experiências cinematográficas que são tão positivas que a vontade é compartilhar e convencer o mundo experimentar também. Assistir Com Amor, Simon foi uma dessas!
O filme adapta o livro da autora Becky Albertalli, "Simon vs. A Agenda Homo Sapiens", e traz a história de Simon Spier, um rapaz de dezessete anos que sofre com o dilema de ainda não ter contado para a sua família e amigos que é gay. Quando descobre que não é o único na escola a manter isso em segredo, passa a trocar e-mails com um rapaz que se identifica como Blue e isso acaba tornando-se uma paixão. Resolver as duas questões se mostra divertido, aterrorizante e uma mudança de vida definitiva.
De uma maneira leve e natural, o longa aborda a jornada de autodescoberta e aceitação de Simon enquanto homossexual, e os desafios de lidar com a reação do mundo a seu redor. Por mais que tenha pais liberais, compreensivos e amorosos, e amigos fieis, ainda há no jovem o medo da rejeição, da decepção e muito mais. E é apenas em Blue que o rapaz encontra, anonimamente, o apoio que tanto precisava e uma paixão sincera.
Como bem dito pelo conterrâneo Diego França, do site Vida e Letras, em sua resenha do filme, um dos pontos positivos da obra é o destaque para a importância do apoio da família e dos amigos nessa jornada, e de como isso é essencial. Sentir que não está só, que é querido e abraçado como se é, é um desejo de TODOS, algo que independe e transcende a orientação sexual. E não tem como não concordar quando ele afirma que a mensagem do filme ultrapassa o adolescente, e se dirige aos pais, avós e outros familiares.

Embora o esqueleto central da obra e o conflito - segredos revelados, autodescoberta e busca pelo amor - sejam típicos de obras do gênero, Com Amor, Simon acerta em cheio na execução de sua proposta, trazendo um elenco diversificado e muito bem preparado para convencer o público, conectando-se com ele de diversas formas, seja por representação direta ou situacional, com drama e comédia em doses certas. Não importa quem você seja, como se identifique, ou com quem se relaciona, a adolescência é uma fase de descobertas e paixões para todos.
Com Amor, Simon é um filme encantador e cativante sobre aceitação e descobertas, que acerta na simplicidade na realização da obra, apresentando de uma forma sensível e divertida o tema, e mesmo com um roteiro que como um todo não é nada de novo, te envolve e te deixa bem no fim das contas. Terminei com vontade de ler o livro, mesmo não sendo meu tipo habitual de leitura.
Fica a recomendação para que no dia 05 de abril - ou na primeira oportunidade - vão aos cinemas conferir a obra.

Universos em Financiamento - Dicas Catarse


Quem acompanha nossas postagens são o quanto a gente dá apoio a iniciativas das mais diversas áreas, seja financeiramente ou com uma divulgação mínima. Mas ultimamente é tanto financiamento coletivo bacana que não dá mais pra a gente dedicar sempre uma postagem especial para cada um deles. Por isso faremos diferente dessa vez: separamos uma sequência especial para você ficar de olho


Vamos começar pelo mais recente? Entrou em financiamento coletivo hoje, dia 09 de Março, às 9h da manhã o RPG Áureos, os Dançarinos da Lua criado por Rey Ooze e vencedor do concurso Faça Você Mesmo 2013 da Secular Games.
Neste jogo você é um Áureo, um ex-escravo que, em um Brasil Colonial Fantástico, usa das bênçãos de seu Orixá e da capoeira para libertar seu povo, enfrentando Coronéis, Capitães-do-Mato, Guardas Volantes e até mesmo lendas folclóricas.
O Áureos utiliza um sistema diferente de resolução das ações. Nele, os jogadores lançam seus dados contra os dados do narrador, em um espaço delimitado, chamado “a Roda”. A colisão entre os dados pode alterar seus valores ou jogá-los para fora da Roda e tudo isso faz parte do jogo, que ganha um aspecto de habilidade dos jogadores bem como sorte, tornando tudo muito imprevisível e divertido.
O financiamento tem duração de 60 dias e a previsão de entrega é Julho de 2018.
Agora que você já está por dentro de tudo confira a página do projeto no Catarse (https://www.catarse.me/aureos) e descubra mais informações sobre quais exatamente são as recompensas, detalhes sobre como seu dinheiro será investido, artes, etc. 


APOIE NO CATARSE - DEGUSTAÇÃO

Para você que gosta de quadrinhos em estilo mangá, está no ar o financiamento do segundo e último volume Teerra & Windy, série criada pela ilustradora e quadrinista Cah Poszar.
Teerra & Windy Vol.2 contará o desenvolvimento das aventuras do trio de amigos, o  arqueiro Luka, a loba mal-humorada Teerra e a sábia harpia Windy. Que mais surpresas esse universo fantástico esconde? Será que quando Luka realizou seu sonho de sair das terras do reino em que vivia e conhecer o mundo era o fim de tudo ou apenas o começo de algo muito, muito maior?
Mas eu não tenho Vol.1, vale a pena apoiar? Não só vale como você deve apoiar. Você pode ler gratuitamente a série pelo Tapas (https://tapas.io/CahPoszar), e também de pode garantir um exemplar físico através de uma das  categorias de apoio disponíveis neste financiamento. Além de poder ter acesso a diversos outros extras, dependendo apenas da sua disponibilidade financeira.
Por se tratar de uma campanha flexível, todos que comprarem vão receber os produtos, mesmo que a meta não seja atingida. Mais ou menos como uma pré venda, mas com direito a itens exclusivos. O financiamento fica no ar por mais 50 dias e a previsão de entrega é Outubro de 2018. 
Agora que você já está por dentro de tudo confira a página do projeto no Catarse (https://www.catarse.me/tw_final) e descubra mais informações sobre quais exatamente são os detalhes sobre o projeto, suas as recompensas, detalhes sobre como seu dinheiro será investido, artes, etc. 


APOIE NO CATARSE - DEGUSTAÇÃO

Se o que procura é mais para literatura aproveite a oportunidade para conhecer a saga O Feiticeiro, da Má Matiazi, ou mais precisamente O Feiticeiro - Vol. 2 - O Rei.
Em O Estrangeiro, ficamos conhecendo os personagens principais e o cenário onde a trama se passa. Observamos Andy Mideline crescer em sua aldeia pacífica e isolada, para então ser lançado em um novo mundo, onde não há espaço para a inocência, nem tempo para cultivar as sementes. A magia, tão íntima e natural a ele, é, nesse lugar, coberta por títulos e burocracia. O Estrangeiro celebra as descobertas - tanto as boas quanto as ruins. Experimenta o amadurecimento, por vezes precoce, de quem passa por perdas, de quem conhece o peso das responsabilidades que o poder traz.
O Rei, chega para concluir a trama contada no volume anterior, pois ambos foram pensados como um único e grande volume. Nele teremos o sepultamento completo da juventude, o desafio de ser responsável pela sobrevivência: tanto a própria quanto a de todo o seu reino. Aqui a magia não é natural, ou burocrática, ela é a missão de sua vida. E, em nome dela e graças a ela, a História será reescrita.
Assim como a dica anterior, você também de pode garantir um exemplar físico do primeiro volume de O Feiticeiro através de uma das categorias de apoio disponíveis neste financiamento, e também outros trabalhos da autora. Além de poder ter acesso a diversos outros extras, dependendo apenas da sua disponibilidade financeira.
O financiamento fica no ar por mais 35 dias e a previsão de entrega é Maio de 2018. 
Agora que você já está por dentro de tudo confira a página do projeto no Catarse (https://www.catarse.me/ofeiticeiro-vol2) e descubra mais informações sobre quais exatamente são os detalhes sobre o projeto, suas as recompensas, detalhes sobre como seu dinheiro será investido, artes, etc. 
Curtiu algum desses? Não esquece que ainda estão em financiamento o RPG Space Dragon - últimos dias - e o livro Sangue de Dragão, sobre os quais já falamos anteriormente. Agora vai lá e conheça esses projetos, e apoie aquele que mais te agradar.

Em financiamento: Sangue de Dragão



Título: Sangue de Dragão - Série Filhos do Fogo Volume 1
Autor: Denis Ibañez
Ano: 2018

Lançar um livro nem sempre é um processo simples, mesmo que você já possua experiência profissional e conheça um pouco do mercado.
A insatisfação com a burocracia da publicação tradicional foi o que fez o autor Denis Ibañez levar seu sonho adiante através de uma campanha de financiamento coletivo para lançar o primeiro volume da Série Filhos do Fogo. Segundo ele "foi a melhor maneira que encontrei de convidar vocês a conhecer o meu sonho e participar de todo o processo junto comigo!"
O projeto da série Filhos do Fogo nasceu após estudos históricos e mitológicos, e das diversas referências que influenciaram diretamente na escrita de Ibañez. Com o universo criado, o autor deu início ao desenvolvimento de toda a história, que se passa muito em um cenário fantástico próprio, anos depois de uma guerra entre dragões e magos. Com as criaturas mágicas extintas até onde se sabe, virando lenda com o passar das gerações.
Sangue de Dragão conta a história de um anti-herói misterioso, precursor de uma rebelião que culmina na morte do rei usurpador Eren do Clã Fogo Negro. A principal proposta do livro se dá na narrativa através da perspectiva de personagens diferentes e do desafio ao leitor para descobrir qual desses personagens, de cidades e vidas tão distintas, seria capaz de se tornar o nosso anti-herói.
Abaixo confira a sinopse da obra.
A ameaça do Povo Antigo assombra as terras de Soteros mais uma vez. Nas terras geladas do norte, o perigo se aproxima cada vez mais dos Hoenir, o povo de Vanir. No sul, nem mesmo o calor do deserto escaldante e as muralhas de Haffic protegerão o povo de pele escura, membros do clã do sol.
Os descendentes dos magos de Andales seguem suas vidas na cidade de Dolain, nas Terras de Sempre Chuva. Os anões de Tormhandus permanecem reclusos no interior da cadeia de montanhas Baloer enquanto os elfos de vida longa se mantêm imparciais e em contato com a natureza na floresta de Dedrain.
Na cidade de Remora, Eren do clã Fogo Negro, o usurpador do trono da linhagem de Altheram, reina em um regime que favorece a minoria e distribui pobreza e miséria à população que vive a sua sombra na Cidade Baixa.
Porém, conforme a sombra de um inimigo há tempos esquecido se aproxima, o chamado do sangue dos descendentes de Altheram, filho do dragão Ignar, se fortalece. Acompanhe a história do bastardo Thar, o nobre Bakon, a assassina Togany e o fazendeiro Bjorn
Qual deles conseguirá fazer o que é preciso, mesmo que isso signifique abandonar a luz dentro de si? Qual deles responderá ao chamado do Sangue de Dragão?
O projeto do Sangue de Dragão entrou em financiamento coletivo pelo Catarse, para arrecadar através dos apoios de leitores e amantes da literatura, a meta de 25 mil reais. A campanha é do tipo flexível, ou seja, mesmo que durante a campanha o valor total não for atingido, o livro irá irá para a produção e todos os apoiadores receberão suas recompensas
Para participar do financiamento de Sangue de Dragão, basta escolher um dos pacotes de recompensas disponíveis, com valores entre R$10 e R$ 1500, que dão direito a recompensas variadas como agradecimentos, exemplar digital e físico, posteres e livros extras, camisetas até escolher nomes de personagens dos outros volumes. Basta escolher o apoio que contemple aquilo que seja do seu interesse e caiba no seu bolso.
A campanha ficará disponível por mais 59 dias no Catarse (a contar de 06/03) e tem entrega de recompensas prevista para Agosto de 2018. Agora que você já está por dentro de tudo confira a página do projeto no Catarse (https://www.catarse.me/ff-sangue-de-dragao) e descubra mais informações sobre o livro: quais exatamente são as recompensas, detalhes sobre como seu dinheiro será investido, artes, etc. Aproveite e confira abaixo um áudio drama especial!
Apoie, divulgue e embarque nessa nave e viaje para os confins do universo em busca de aventuras!


Count Zero (Trilogia do Sprawl #2)

Count Zero, de William Gibson, é o segundo volume da Trilogia do Sprawl, uma das séries mais cultuadas da ficção científica. A obra, passada sete anos após os eventos de Neuromancer, continua a apresentar a evolução da Matrix e das inteligências artificiais que a habitam, agora, conhecidas como Deuses Vudus
É nesse universo frenético e superconectado que duas poderosas corporações multinacionais, Maas Biolabs e Hosaka, travam uma guerra pelo controle de uma nova tecnologia, o biochip. Para isso utilizam todos os métodos possíveis de espionagem desde Hackers até violentos mercenários.
Em meio a esse caos futurista, Bobby Newmark, um aspirante a cowboy, acaba entrando de gaiato nessa história. E ele estaria morto, se não fosse a intervenção salvadora de uma misteriosa garota feita de luz. Por causa disso, Bobby – agora, Count Zero- se torna uma pessoa valiosa e é aí que a caçada começa.
Título: Count Zero
Autor: William Gibson
Série: Trilogia do Sprawl #2
Editora: Aleph
Tradutor: Carlos Angelo
Ano de Publicação: 2017 / Páginas: 312


Count Zero é a continuação de Neuromancer e o segundo volume da Trilogia do Sprawl de William Gibson. Publicado originalmente de forma serializada a partir de Janeiro de 1986 na Isaac Asimov's Science Fiction Magazine, o romance foi indicado para os prêmios Locus, Nebula e Hugo e é destacado como um exemplo de narrativa cyberpunk.
No livro acompanhamos de forma intercalada três tramas independentes que aos poucos vão se entrelaçando até culminar num clímax simultâneo em eventos que ocorrem sete anos após aqueles mostrados no livro anterior.
Atualmente, duas poderosas corporações multinacionais, a Maas Biolabs e a Hosaka, se engajam numa disputa pelo domínio de uma nova e poderosa tecnologia, o biochip, utilizando-se de hackers e da matrix além de táticas de espionagem e violência bélica. Cowboys do ciberespaço vêm relatando acontecimentos bizarros na matrix, fantasmas, vozes e presenças que se auto intitulam como divindades vodus passam a fazer parte da rotina daqueles que se aventuram a quebrar as defesas dos sistemas de segurança em busca de dados informáticos valiosos.
É neste contexto que somos apresentados aos protagonistas: Turner, Bobby e Marly. Turner é um mercenário contratado por gente poderosa e influente para missões perigosas. Traído pelos seus colegas de equipe durante uma operação de extração de um alto executivo pivô de uma disputa entre duas zaibatsus, ele acaba morrendo em missão numa explosão catastrófica logo nas primeiras páginas, mas é revivido logo em seguida com avançadas técnicas de clonagem e cópia digital de memórias. Ele é peça importante demais para algumas organizações para simplesmente continuar morto.
Bobby Newmark é um wilson, um cowboy novato, cujo codinome no ciberespaço é Count Zero e que recebe de uma de suas fontes, o traficante Two-a-Day, um novo software hacker para testar. Durante essa tentativa algo dá errado e ele quase morre sendo atacado de volta por poderosos sistemas de defesa e segurança, mas acaba sendo salvo da morte por uma estranha manifestação na matrix na forma de uma garota feita de luz. Sua experiência desperta o interesse de gente poderosa, mas ele logo é contactado por Lucas, Beauvoir e Jackie, que se dedicam a pesquisar as manifestações das deidades vodu na matrix e lhe prometem proteção.
E por fim somos apresentados a Marly Krushkova, uma curadora de arte dona duma pequena galeria em Paris que é contratada pelo bilionário excêntrico Josef Virek para investigar a origem e o criador desconhecido duma série de novas caixas futuristas que emulam o estilo do artista Joseph Cornell.
A profusão de personagens em torno do trio de protagonistas e a demora para as tramas paralelas se entrelaçarem acabou por tornar a leitura arrastada e decepcionante em alguns momentos. Nenhum dos personagens me cativou tanto quanto Molly e Case em Neuromancer, simplesmente não consegui me importar o suficiente com nenhum deles.
Marly e Virek protagonizaram os melhores momentos ao me lembrarem das metáforas e do dilema tênue e conflituoso entre máquina e humanidade. Bobby era um cowboy novato e deslumbrado, que, enredado numa trama muito maior do que a si mesmo, teve que ater-se a uma passividade incômoda sobretudo quando contrastado com Case. E Turner apesar de toda banca de mercenário fodão se perdeu em meio às reviravoltas envolvendo seus aliados e as maquinações obscuras das zaibatsus com as quais fazia jogo duplo. Assim como em Neuromancer, as inteligências artificiais são muito mais interessantes que os humanos também aqui. Numa espécie de evolução daquilo que Neuromancer e Wintermute se tornam no primeiro livro, agora elas existem na matrix como partes distintas fragmentadas e assumem aspectos místicos de figuras do vodu haitiano. Alta tecnologia mesclada ao misticismo produz implicações para lá de interessantes e leva a discussão levantada no livro anterior sobre inteligências artificiais e sua forma de se relacionar com o mundo e a humanidade a um novo nível. Se hoje experimentamos coisas muito semelhantes àquelas mostradas em Neuromancer com os algoritmos e o uso que fazemos diariamente das redes sociais, fico curioso e temeroso do que pode nos esperar num futuro semelhante ao de Count Zero.
Os jargões tecnológicos e conceituais no livro são facilmente assimilados conforme vão sendo citados: decks, simstim, zaibatsus, biochips, wilson, holocraft, arcologias, dermas entre outros,e não se mostraram como os maiores empecilhos para compreensão da trama. O mesmo não pode ser dito sobre as sucessivas autorreferências ao próprio universo que estão lá para compor uma estética de um mundo futurista e que obviamente não é como o nosso, mas que raramente são explicadas. O glossário ao final do livro é de grande ajuda nestes momentos.
Count Zero se mostrou um livro confuso e desafiador do início ao fim. Não há quase nada para se guiar a princípio, apenas a exposição de diversas peças que não se ligam de forma clara ou lógica até o final. Esse caminhar às cegas me incomodou bastante, mesmo tendo conseguido juntar boa parte delas no desfecho. A prosa do Gibson perdeu parte de sua poesia sinestésica em detrimento de acontecimentos rápidos e duma maior quantidade de diálogos e cenas explosivas de ação. Count é alucinante, mas com uma trama desnecessariamente complexa, onde o acaso e o bizarro caminham lado a lado, sem se importar com a presença do leitor.
A edição brasileira mais recente é da Aleph e conta com tradução de Carlos Angelo. Originalmente lançada num box com os demais volumes da Trilogia, ela agora encontra-se disponível também de forma avulsa. Houve uma revisão da tradução e uma adequação dos termos nos três livros para este relançamento, cuidado que merece ser destacado, bem como as novas e belas imagens de capa de Josan Gonzalez e o projeto gráfico assinado pela Desenho Editorial.
Count Zero não é uma leitura das mais indispensáveis ou tão revolucionária quanto seu predecessor, Neuromancer, mas não posso deixar de notar as inovações feitas por Gibson em relação a sua prosa. Pra mim elas até tiraram um pouco do brilho do livro anterior, mas é inegável a ousadia do autor em tentar algo diferente e mais desafiador, tais como as já comentadas características da quebra de linearidade, da fragmentação da trama e a condução para um clímax conjunto das mesmas. Para quem terminou Neuromancer se perguntando como as IAs passaram a se comportar após Wintermute, o que aconteceu com os domínios espaciais da Tessier-Ashpool ou como o mundo cyberpunk e a matrix estão convivendo anos depois, Count Zero traz um pouco de luz sobre estes acontecimentos, enquanto se aprofunda ainda mais na política organizacional das zaibatsus, traz um aspecto místico e religioso para a alta tecnologia e flerta com os limites da arte e daquilo que nos torna humanos. Tudo isso sem preocupação alguma de manter o leitor com os pés no chão. A sensação de lê-lo é a mesma de mergulhar fundo num mundo onde as bases ruíram e nada é mais tão impossível ou estranho demais.