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Guerra do Velho

A humanidade finalmente chegou à era das viagens interestelares. A má notícia é que há poucos planetas habitáveis disponíveis – e muitos alienígenas lutando por eles. Para proteger a Terra e também conquistar novos territórios, a raça humana conta com tecnologias inovadoras e com a habilidade e a disposição das FCD - Forças Coloniais de Defesa. Mas, para se alistar, é necessário ter mais de 75 anos. John Perry vai aceitar esse desafio, e ele tem apenas uma vaga ideia do que pode esperar.
"Guerra do Velho" é frequentemente comparado a um dos maiores clássicos da ficção científica: Tropas Estrelares, de Robert Heinlein. O próprio Scalzi já confirmou que Heinlein é uma das suas maiores influências e que a obra foi escrita seguindo os princípios que ele acredita serem próprios da escrita do autor que tanto admira. Scalzi é um dos principais nomes da ficção científica contemporânea. Ganhador dos prêmios Hugo e Locus, o autor conquistou público, crítica e mercado. Em fevereiro de 2015, fechou um contrato com a editora Tor Books de cerca de $3,4 milhões, para publicar 13 livros nos próximos 10 anos. O canal SyFy está produzindo uma série de TV – chamada Ghost Brigades – como adaptação do livro, e a Paramount já comprou os direitos para levar a história para as telas do cinema.
Título: Guerra do Velho
Título Original: Old Man's War
Editora: Aleph
Autor: John Scalzi
Tradução: Pete Rissatti
Ano: 2016 / Páginas: 368


Fiquei muito curioso com a proposta de Guerra do Velho tão logo o livro teve a sua publicação no Brasil anunciada pela editora Aleph em 2016. Curiosidade esta que só aumentou com resenha muito positivas em diversos blogs e canais literários que acompanho e também com a recomendação empolgada do Ace Barros desta obra em nosso podcast de número 14 aqui no Multiverso X.
Guerra do Velho é o romance de estreia de John Scalzi e fez um enorme sucesso em seu país de origem sendo agraciado com diversos prêmios literários e logo tendo os direitos de adaptação vendidos. A frase usada como slogan para vendê-lo é uma daquelas que já diz tudo e atiça instantaneamente a nossa curiosidade por subverter todo o nosso senso comum sobre guerras, soldados e velhos. “No meu aniversário de 75 anos fiz duas coisas: visitei o túmulo da minha esposa, depois entrei para o exército.” diz John Perry logo na primeira página do livro e é impossível não querer saber todos os "comos" implícitos nisto. Então o que inicialmente pode nos parecer um absurdo vai sendo desenvolvido de forma eletrizante nas páginas seguintes deste romance.
Num futuro próximo a humanidade finalmente dominou a tecnologia para que as viagens espaciais se tornassem algo corriqueiro e possibilitassem a colonização e a exploração de outros planetas. No entanto dado os perigos do espaço e os conflitos com outras raças alienígenas foi necessário criar também um exército independente para garantir a segurança e a sobrevivência dos colonos terráqueos nestes novos planetas, as Forças Coloniais de Defesa ou FCD.
É nas FCD que John Perry o nosso protagonista e aniversariante de 75 anos se alista. Como um terráqueo, John tem uma noção muito vaga das missões que o aguardam e sabe pouco do que acontecerá com ele quando estiver a serviço. Ele imagina que será submetido a um processo extraordinário de rejuvenescimento para que seu corpo possa se tornar apto a combater numa guerra novamente, mas as FCD mantém total sigilo sobre os procedimentos e técnicas que aplica em seus soldados e tudo o que se sabe sobre isto na Terra é mera especulação. Por um motivo misterioso, em suas fileiras só são aceitos recrutas com mais de 75 anos e após se alistar nas FCD o terráqueo idoso é oficialmente dado como morto, mas só será colocado a par de toda a situação acerca do seu futuro quando já estiver no espaço. John não teme essa incerteza, pensa que não tem mais nada a perder e já tomou sua decisão. Assim, com um breve suspense sucedido de muita ação o livro conta o que aconteceu a John nos anos que em que serviu às FCD e acredite, não foi pouca coisa!
A história é totalmente narrada pelo protagonista e apresenta uma excelente fluidez em capítulos curtos ao longo de três partes. A primeira cria uma expectativa enorme em como será o tratamento para tornar os idosos hábeis para os combates de guerra que os esperam, as últimas já os mostram em treinamento e em missão e são muito bem dosadas em adrenalina, velocidade e desenvolvimento de mundo e bom humor. Também vale destacar o projeto gráfico do livro e o cuidado da Aleph com a tradução, design e revisão, absolutamente impecáveis.
Senti uma certa dificuldade em criar empatia com o protagonista sobretudo nas cenas iniciais, mas com o tempo fui me apegando ao seu jeito teimoso e um tanto bonachão e ganhando familiaridade ao ponto de ser impossível não torcer por ele a cada missão complicada para a qual era designado. Mesmo já tendo uma idade considerável no início do livro, John Perry descobre que ainda há muito pelo que viver, nem que isso signifique nunca mais voltar à Terra ou ter que explodir mais cabeças de alienígenas por dia do seria capaz de contar de uma vez.
A rapidez na leitura é favorecida por uma dose mínima de descrições e contextualização. O autor parece se valer daquilo que já conhecemos da própria cultura pop para nos poupar de detalhes tediosos que apenas tornariam o texto truncado. Viagens espaciais, implantes biológicos, supercomputadores, armas destrutivas e raças alienígenas extravagantes são descritos de forma breve, mas plausível compondo um cenário típico de ficção científica de viagens espaciais e de guerra. Senti falta de mais ciência no livro, mas dada a condição de soldado do narrador fiquei satisfeito com o seu modo mais objetivo e prático de nos contar sua história sem se ater tanto aos detalhes e focando mais nos efeitos gerados pela tecnologia e ciência envolvidos.
O livro também nos leva a pensar sobre a velhice, dificilmente pensamos nela enquanto somos jovens ou enquanto estamos muito ocupados tentando ser adultos bem sucedidos. Os anseios, as dúvidas e as reflexões dessa fase da vida trazem contornos muito humanos e particulares ao protagonista e aos seus aliados nas FCD. Enxergar o mundo com os olhos de quem já viveu de tudo e agora se encontra praticamente só no mundo, já seria por si só fascinante, mas experimente transformar uma pessoa destas num soldado plenamente capaz com as missões mais perigosas e alucinantes à frente e vemos nossas perspectivas se alargarem num horizonte infinito de possibilidades.
A expansão humana e a colonização do espaço bem como suas implicações são outros temas que inevitavelmente nos levam à reflexão. No livro, a guerra contra outras raças alienígenas é sempre preterida à diplomacia quando estas raças se mostram minimamente hostis a nós, ainda que sejam tão ou mais inteligentes e tecnologicamente mais avançadas. A guerra é o caminho mais eficiente para garantir nossos objetivos e segurança nas colônias e pensando bem isso é bem lamentável sobretudo quando pessoalmente preferimos adotar uma posição pacífica.
Guerra do Velho foi uma leitura leve e extremamente divertida, com muita ação e com um dos argumentos mais inusitados dos últimos tempos sem pecar em crítica e em reflexões mais profundas. Ao término fica uma gostosa sensação de quero mais! É um livro que funciona muito bem como um romance de entrada no gênero de ficção científica, mas agrada também a leitores mais exigentes pelo ineditismo de algumas das situações com as quais somos brindados em sua trama sobretudo a velhice e o militarismo. É ideal para uma leitura descompromissada, mas que ainda assim vai te surpreender com a sua abordagem inusitada e explosiva para a exploração espacial, além de certamente lhe proporcionar umas boas horas de diversão de muita qualidade!