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Peter Pan

Todas as crianças crescem, menos uma.
Um dos mais populares clássicos infantis, Peter Pan é uma história que, como Alice no País das Maravilhas, une gerações, contagiando também adultos com sua energia, imaginação e um enredo que permite diversos níveis de interpretação.
Essa tradução do texto integral da obra de J.M. Barrie transporta crianças e adultos para um mundo mágico, povoado pela família Darling e pelos habitantes da Terra do Nunca - Peter Pan, os meninos perdidos, Sininho, o Capitão Gancho e seus piratas... A versão impressa apresenta ainda capa dura e acabamento de luxo.


Título: Peter Pan
Autor: James Matthew Barrie
Tradução: Julia Romeu
Ano 2014 / Número de Páginas 256


Peter Pan é uma daquelas histórias que desde muito cedo passam a fazer parte da nossa bagagem cultural através das muitas adaptações e versões que nos chegam pelas mais diversas mídias. Quem nunca ouviu algo a respeito do intrépido garoto que não queria crescer? Ou da Terra do Nunca onde todas as aventuras são possíveis? E da fada Sininho ou do temível Capitão Gancho? Apesar desta grande popularidade, pouca gente têm contato direto com a história original de James Matthew Barrie. Lê-la de sua fonte original pode reservar boas surpresas para o leitor.
Como acontece com muitas histórias, Peter Pan foi originalmente concebido enquanto Barrie entretinha os filhos de um casal de amigos seus lhes contado uma história. Posteriormente ele aproveitou os personagens e alguns elementos dessa história para compor uma peça teatral cujo sucesso estrondoso o levou a escrever e publicar uma versão definitiva em prosa, publicada em 1911 com o título de Peter Pan e Wendy. Monteiro Lobato foi responsável pela popularização da história no Brasil ao recontá-la através dos personagens do Sítio do Pica-Pau Amarelo em 1930. Depois vieram as muitas animações e produções cinematográficas, sendo a da Disney de 1953 provavelmente a mais popular delas.
A história é ambientada na Inglaterra e se foca inicialmente na família Darling, descrevendo como foi a sua formação, a chegada das crianças, Wendy, Pedro e Miguel e o modo como elas vivem atualmente, tendo a cadela Naná como uma espécie de babá. Peter Pan aparece inicialmente como uma espécie de amigo imaginário dessas crianças, com as quais brincam e interagem com frequência. Numa noite em que os pais delas precisam sair para um evento social, o Sr. Darling se irrita com Naná e a prende do lado de fora da casa. Essa é a oportunidade perfeita que Peter Pan (sim, ele existe!) esperava para recuperar sua sombra, que em visitas anteriores fora separada do seu corpo com uma mordida certeira da cadela-babá. É Wendy quem o recebe quando ele entra pela janela e fica encantada com as habilidades do garoto, sua esperteza e sua capacidade de voar e ajuda-o a costurar a sombra novamente no seu devido lugar. Peter conta que ele, Sininho e os Meninos Perdidos vivem na Terra do Nunca, um lugar para onde as crianças vão quando suas babás se descuidam e elas caem de seus carrinhos e convida Wendy para ir com ele até lá, para contar histórias para eles e ser sua mãe. Wendy acaba aceitando a proposta fascinada com a possibilidade de conhecer as maravilhas encantadoras daquele lugar, apenas pedindo que Peter leve seus irmãos mais novos também. Logo Peter Pan ensina a eles como devem fazer para voar e partem todos para a Terra do Nunca, localizada à segunda estrela à direita, direto até o amanhecer.
Dois temas se destacam em meio as inúmeras aventuras que as crianças e Peter vivem na Terra do Nunca. O primeiro e o mais característico é a questão do crescimento. É notória a aversão de Peter pelas responsabilidades ou a quaisquer sinais que remetam à vida adulta, sobretudo quando percebemos os sentimentos conflituosos dele para com Wendy, Sininho e a Princesa Tigrinha. O segundo grande tema é a perda, tanto dos pais quanto da inocência e displicência infantil. Ao viver por tanto tempo na Terra do Nunca, Wendy se dá conta de que começa a esquecer dos próprios pais, percebe a atitude egoísta que tivera ao abandoná-los pela liberdade oferecida por Peter Pan e anseia poder voltar para eles. Ao fazê-lo ela opta por crescer e aos poucos perde o contato com o onírico, as histórias, a fantasia e a aventura ao lado de Peter Pan.
Me peguei questionando em vários momentos alguns dos comportamentos vistos nos livros e não consegui me abstrair deles durante a leitura. A facilidade com que Wendy assume para si todas as tarefas domésticas e as responsabilidades de ser uma mãe para Peter e os Meninos Perdidos foi talvez o mais incômodo deles pelo estranhamento, ainda que possa ser interpretado como uma mera representação de uma típica brincadeira de casinha. Sininho é representada como um ser feérico inconstante e me surpreendeu por demonstrar ciúmes extremos de Peter, inclusive planejando a morte de Wendy em dado momento. Aliás a forma banal como a morte é descrita e narrada também é algo problemático. Em meio aos conflitos entre os vários povos da Terra do Nunca e os piratas do Capitão Gancho, as baixas são incontáveis! Novamente talvez devesse interpretar como apenas mais uma das brincadeiras corriqueiras que crianças fazem o tempo todo. Acredito que Peter Pan será melhor apreciado por crianças que podem se abster de alguns desses questionamentos em detrimento da aventura onírica que ele propõe com muito mais facilidade. Para os já adultos fica um pouco mais difícil não enxergar alguns destes pontos com um pouco mais de malícia e talvez isso comprometa o sabor displicente de uma história de entretenimento, ainda que ela trabalhe o tempo todo com a psicologia e a visão infantil do mundo.
Peter Pan é um clássico infantil, influente e presente e por isso merece ser conhecido diretamente de sua fonte original. Ainda que a leitura para mim não tenha sido tão imersiva quanto eu esperava, não posso deixar de reconhecer o seu valor ao trabalhar bem tantas cenas carregadas de magia e de sutilezas talvez possíveis apenas para os corações mais puros e inocentes. Para voar com esta história, recomendo fazer antes o exercício proposto por Peter quando ensina as crianças a arte de voar pela primeira vez: “Você tem que pensar em coisas boas e lindas e elas suspendem você no ar.” Para alguns funciona, para outros talvez seja necessário um bom punhado de poeiras das fadas.