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O Rei Amarelo em Quadrinhos

A redescoberta da obra de Robert W. Chambers, autor dos contos sobre a peça de teatro maldita O Rei Amarelo, inspirou essa coletânea com oito histórias em quadrinhos cheias do mais doentio horror em preto, branco e amarelo.
São 164 páginas macabras inspiradas pela leitura do livro amaldiçoado, visões amareladas que forçaram os artistas a realizar histórias originais que destruíssem tudo à sua volta, até eles mesmos.
A organização do álbum enlouqueceu Raphael Fernandes, que aprisionou um time de quadrinistas formado por Pedro Pedrada, Tiago P. Zanetic, LuCAS Chewie, Mauricio R. B. Campos, Péricles Ianuch, Airton Marinho, Marcos Caldas, Erik Avilez, André Freitas, Tiago Rech, Victor Freundt, Rafael Levi, Samuel Bono e Raphael Salimena. Todos enclausurados por uma sinistra capa de João Pirolla.
O Rei Amarelo em Quadrinhos é o terror na sua forma mais bruta, trazendo imagens cativantes e perturbadoras interpretações para a busca por Carcosa. Mas, acima de tudo, é um mergulho em um poço ocre onde a esperança de emergir para a realidade não passa de um sonho em duas cores.

Título: O Rei Amarelo em Quadrinhos
Editora: Draco
Organização: Raphael Fernandes
Número de páginas: 164


Lançado durante o 9º FIQ - Festival Internacional de Quadrinhos, em Novembro de 2015, O Rei Amarelo em Quadrinhos se inspira na mitologia amarela do clássico de horror de Robert W. Chambers, O Rei de Amarelo, para compor novas histórias com alguns dos elementos mais sombrios e perturbadores da obra original.
Composta por um time de 14 roteiristas e artistas, a coletânea conta com 8 histórias que variam no tom e no estilo, tendo como elemento de coesão a inquietante presença amarela, tanto do livro amarelo com sua peça maldita que corrompe e destrói a vida e a mente de quem se dispõem a lê-lo quanto os elementos míticos e místicos dela tais como Carcosa, Hastur, Cassilda, Istar e o próprio Rei de Amarelo.
Já falei sobre O Rei de Amarelo e de sua influência na literatura de horror ao longo dos mais de 120 anos da data de sua publicação original em 1895 na resenha do livro. Esta HQ perpetua e expande o universo ficcional de Chambers para outras fronteiras aumentando ainda mais o fascínio macabro que a cor maldita é capaz de exercer no leitor e comprova a alta qualidade e o cuidado da Draco com as suas publicações de quadrinhos. Não vou comentar cada história como fiz com o livro mas quero citar três das minhas favoritas:
“Fantasmas na Máquina” com roteiro e arte de Pedro Pedrada traz os elementos do horror amarelo para um cenário atual com redes sociais bem como uma crítica contundente ao nosso comportamento, expondo a maneira com que encaramos o medo e a loucura hoje. Nela uma mulher recebe o livro amaldiçoado por engano numa compra online e assim que o lê recebe um convite para participar de uma nova rede social. Não preciso dizer que a sua vida nunca mais será a mesma… É apenas a primeira história da antologia e posso dizer que o impacto e o baque que ela causa no leitor já faz a HQ se pagar.
“A Rainha de Amarelo” conta com a ilustre presença do escritor e poeta Edgar Allan Poe como um personagem. Num cenário vitoriano ela ele tem contato com a peça fictícia e fica obcecado com a mística por detrás dela. A presença de uma autômato e de vários dos elementos da peça nos quadrinhos me chamaram muito a atenção, bem como a arte de Péricles Ianuch, uma das minhas favorita da coletânea. O roteiro de Maurício R. B. Campos é instigante e é bem fiel ao clima dos contos de Chambers.
“Medíocre” com arte e roteiro de Raphael Salimena é a história que encerra a coletânea e traz um crítico literário que considera o tão afamado O Rei de Amarelo como algo… medíocre, não vendo nada demais na peça e que valesse ser cultuado como alta literatura. Inconformando-se com o quanto ela é elogiada e consumida, ele indigna-se cada vez mais com a sua popularidade. A.virada vem com uma grande epifania que nos faz refletir sobre o quanto da ficção e da loucura da peça não são realmente ficção. A loucura pode não estar no livro mas em nós mesmos.
Além das excelentes histórias o álbum também chama a atenção pelo seu projeto gráfico incomum. Todas as histórias foram compostas em duotone e as únicas cores presentes nele são o preto e branco e o amarelo o que além de criar uma estética peculiar contribui para a imersão no simbolismo desta cor. As páginas internas em couche são de ótima qualidade e a capa ilustrada por João Pirolla me fez cobiçá-lo tão logo vi a notícia de seu lançamento. Há pequenos erros de revisão em alguns balões mas nada que prejudique a experiência de leitura.

Além de nos divertir e entreter também é papel da literatura (e dos quadrinhos, por que não?) nos tirar da nossa zona de conforto e nos causar reações. Isto tanto o livro quanto a HQ fazem com louros. O Rei Amarelo em Quadrinhos é uma ótima pedida para os fãs de literatura de terror e horror e de quadrinhos mais sombrios e com temáticas adultas. Suas histórias perturbadoras e viscerais e seu clima claustrofóbico e apavorante despertaram imediatamente minha curiosidade pelo clássico livro de Chambers cuja leitura, confesso, eu postergava já há um bom tempo. As histórias narradas aqui são ainda mais ousadas em suas premissas do que as do livro e me fisgaram completamente. Recomendo demais!